25 maio, 2013

anotações na virada


Anotações na virada

Durante os intervalos de cores, sons e sonhos, anotei diversas frases, palavras, trechos de narrativas que talvez apareçam no futuro. Quando compadre Sacha estava cantando lembrei-me do trecho (fiz da arte minha religião) que escrevi no comentário sobre Sarau da Casa Amarela em 2011, bisado abaixo por que gostei de ler os dois assim juntos.
 

Impressões do incomodo
Roer um naco do real é dar ao imaginário a capacidade de cercar, sorver, multiplicar, acionar as manifestações do imaginar. Antes de ser um exercício de desejar a complexidade, é um momento de perceber as relações entre os vividos e a manifestação estética, é um instante de apreender a criação em ação, é uma atenção aos elos invisíveis, mas poderia ser também apenas refletir o bom Sartre. E não o é aqui. Ainda assim o inferno é os outros quando planta em nossa emoção um fel maior que nossa capacidade de diluir.

O poema “Temístocles” se faz de uma enorme carga lírica, que o poeta mesmo conhecendo o real heróisãmiguelino, rói o naco do real, desenvolve um voo em sua alma, traz de seus confins, o personagem possível apenas no imaginado pranto de quem colore o anjo caído com os tons do tempo agora revelados em camadas nos vãos dos buracos das balas. Encontra o guerreio caído sem pieguice. E as palavras não querem e não fazem versos piedosos.
A reflexão parece não acontecer dentro da narrativa. Interversos, as flexões pronunciam... Uma notícia... vinda direto do eu lírico que a ilumina, poematizando em cada verso: poesia e sem o amargor da denúncia, anuncia. Ilumina, fora do bem, fora do mal.
Um texto escrito em versos, portanto poesia. Assim nessa definição tão simples e longe de maneirismos estéticos duvidáveis ou inaudíveis. Sem impressionismos. Revela uma necessidade do eu lírico de narrar sem enredar, direto de um sem-lugar, não espaço... cintilancias.

Sem impressionisses, o poema homenagem de Sacha Arcanjo, foi um achado superior, perfeito para abrir minha vocalização de poema&poesia, a fim de reverenciar a dignidade da história do MPA, na programação da virada cultural em 2013.
Agora todos os outros podem morrer sem ter conhecido o naco do real: a história de Temístocles, o incomodo, por sua própria voz. 

Sacha Arcanjo com seus versos sangrados no moderno de drumonds e bandeiras nos permite morrer conhecendo a imprudência d’o inferno dos outros instalado na aura de um guerreiro. Impar como qualquer bom outro.

 
Temístocles
O incomodo Temístocles
Um poeta zen profundo
Foi encontrado morto
No horto do submundo.
 
 
Sua alma estilhaçada
Pelos buracos de bala
Largou o corpo sozinho

Esticado numa vala.
 
Foi se esconder numa fenda
Lá na cerca da capela
 
Bendito louvado seja.
 
Perdeu-se seu intelecto
 
Só por falta de prudência
 
Sucumbiu sua peleja.
(29\12\2011)

 

 

Na cesta de Sacha

No sarau da casa amarela, Akira arranjou uma sexta para Sacha contar as razões e emoções que os destinos colocaram na arte que faz da vida e na vida que faz da arte. Deliciosamente nos embalou com seus artigos de primeira necessidade. Sim, depois que você o conhece, ouve, lê e vê bem dentro dos olhos dele cantando, não pode imaginar mais a própria vida, a emoção, seu próprio ritmo sem continuar ouvindo o Mestre sempre, para religar a alma à Natureza Superior.



Fiz da arte minha religião. Escolhi alguns sacerdotes para me ligar às estrelas. Sacha é um desses, que não sai da minha tenda de orações. No sarau da casa amarela isso mais uma vez ficou provado.


Foi uma sessão de emoções. A flor da pele instalou-se nos bons que ali foram receber as sutras sertanejas de Sacha Arcanjo. Não cantou “ Água clara de cascata” nem ”Última fome". E ainda assim o cidadão-cantante trovou mais uma vez meu coração e minha mente. E se engolimos algumas lágrimas, foi apenas para lubrificar a garganta e desembargar a voz.
 
Cg. 09/10/2011.

22 maio, 2013

testamento dia



o que esperar do poema?

que esteja sempre
grávido de poesia
quando for visitado

adote o pai
que lhe empreste forma

e a mãe tenha sempre
um leite bom
no coração da palavra.

se houver
 
 

última estréia

última estréia

quando você pensar
na luz para meu vôo
em direção ao eterno

quando você pensar
em sonhar meu sorriso

quando você olhar
as cinzas espalhadas
dançando ao vento

quando você cantar
minha última serenata
e sol nascer no luau

traga um balé de sardinhas
dançando cantora de cabaré
num leve portunhol

para que eu possa
me sentir em casa

outravez

19 maio, 2013

zen de rua

bebo cachaça para alimentar a alma

tomo água para refrigerar a carne

descomo palavras para treinar a calma